Segundo dados divulgados pela Agência
Nacional de Saúde Suplementar (ANS) em dezembro de 2009, mais de 42
milhões de pessoas no Brasil possuem plano privado de saúde, sendo
que 11% desse montante são idosos, o que representa uma massa de
aproximadamente 5 milhões de segurados com mais de 60 anos.
Diante deste quadro, cabe refletir sobre eficácia da normatização
brasileira para proteger os idosos nas relações contratuais
mantidas com os planos e seguros saúde.
Como o idoso representa custos maiores para as operadoras de planos
de saúde, é muito comum que essas empresas utilizem artifícios para
impedir o acesso de clientes acima de 60 anos aos seus produtos,
ou, ainda pior, expulsá-los no momento em que mais precisam de
assistência médica.
Dentre as condutas abusivas, a mais recorrente é a imposição de
reajuste abusivo quando o segurado entra na faixa etária acima dos
60 anos, o que muitas vezes corrobora para seu descredenciamento,
tendo em vista a falta de recursos do idoso para arcar com aumentos
excessivos.
Importante ressaltar que nas relações de consumo, o idoso é
duplamente vulnerável. Primeiramente, pelo arrefecimento de suas
capacidades físicas e intelectuais, o que torna mais impraticável
seu adequado discernimento para julgar a atividade negocial dos
fornecedores. Logo, seu próprio estado carece de um maior cuidado,
especialmente com relação aos serviços de saúde, dos quais é
extremamente dependente. Isso torna imprescindível uma especial
proteção a este tipo de consumidor.
Por isso, a Constituição Federal de 1988, em seu artigo 230,
preconizou que “A família, a sociedade e o Estado têm o dever de
amparar as pessoas idosas, assegurando sua participação na
comunidade, defendendo sua dignidade e bem-estar e garantindo-lhes
o direito à vida.”
Para dar eficácia a este preceito constitucional, foi criado o
Estatuto do Idoso (Lei 10.741/2003), em vigência desde 1º de
janeiro de 2004, que impede, em seu artigo 15, §3º, que o idoso
seja discriminado nos planos de saúde.
Essa disposição normativa implicou na alteração da legislação
especifica da área de saúde privada no Brasil, tanto que a ANS, por
meio da Resolução 63/2003, estipulou 59 anos como última idade
passível de sofrer reajuste por mudança de faixa etária. Vale
frisar que o Estatuto do Idoso aplica-se a qualquer contrato de
plano de saúde, independente se firmado antes ou depois de sua
entrada em vigor. Neste sentido já se posicionou o Superior
Tribunal de Justiça, ao julgar o Recurso Especial nº 707.286/RJ: “O
interesse social que subjaz do Estatuto do Idoso, exige sua
incidência aos contratos de trato sucessivo, assim considerados os
planos de saúde, ainda que firmados anteriormente à vigência do
Estatuto Protetivo”.
Mesmo em face dessa regulamentação, as empresas de saúde mantêm
disposições contratuais que estabelecem reajustes abusivos,
decorrentes de mudança de faixa etária acima dos 60 anos, por
entenderem, equivocadamente, que os planos antigos não se sujeitam
às proteções do Estatuto do Idoso.
Diante da omissão da ANS em fiscalizar e impedir abusos contra os
idosos que participam de planos de saúde contratados antes do
advento do Estatuto do Idoso, o Judiciário, cada vez mais acionado
para solucionar conflitos, vem se posicionando em favor do
consumidor idoso.
Portanto, até que a Agência Reguladora exerça sua real função, de
fiscalizar e regular o setor da Saúde Suplementar, principalmente
para impedir a discriminação do idoso pelos planos de saúde,
teremos o Poder Judiciário assumindo tal papel de forma atuante,
colocando a função social do contrato de assistência médica acima
dos interesses econômicos das operadoras.
Rafael Robba é bacharel em direito pela Universidade Santo Amaro
(UNISA), especializado em Responsabilidade Civil na Área da Saúde
pela Fundação Getúlio Vargas (FGV), membro da Comissão de Defesa do
Consumidor da OAB/SP e membro do Vilhena Silva Advogados.
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