Nos últimos anos, diversas
investigações da Justiça revelaram apenas a ponta do iceberg da
corrupção. Muitas vezes, avaliamos que o comportamento do povo de
um país no trânsito revela que tipo de sociedade impera e como são
os políticos daquela nação. Quanto mais respeito no trânsito, menos
corrupção.
Em qualquer grande cidade brasileira,
assistimos diariamente representantes da elite levando os seus
filhos para a escola. A maioria dessas escolas são particulares.
Muitos deles param em locais onde não é permitido e outros, em fila
dupla, como se tivessem mais direitos do que os outros. Essa
postura, muitas vezes, passa dos pais para seus filhos, porque eles
são os exemplos que conhecem e tem muita semelhança com o
comportamento de muitos políticos e agentes públicos no Brasil.
Nas estradas, muitos motoristas ainda
respeitam as normas, mas outros trafegam pelo acostamento,
ultrapassam em local proibido, conduzem em excesso de velocidade e
depois exibem todas essas infrações com orgulho em redes sociais
como o Facebook, por exemplo. Talvez seja por pura exibição, mas
com certeza, também pela convicção da impunidade, algo que é
bastante frequente no setor público, seja no Executivo como no
Legislativo.
Nas cidades, o processo é similar.
Pessoas atravessam fora da faixa de pedestres e não esperam o sinal
abrir para realizar a travessia. A justificativa? A pressa, ou
seja, a minha necessidade de chegar logo do outro lado é mais
importante do que respeitar as leis. Quando falo isso, lembro do
meu velho pai que, já bem idoso, quando atravessava a rua na faixa
e com sinal fechado para o trânsito me alertava sobre os
motoristas, brincando: “Rápido, eles já nos viram!”. Era um jeito
bem-humorado de lembrar que o homem atrás do volante, com o poder
nas mãos, costuma esquecer rapidamente que, no trânsito, assim como
na vida, somos todos pedestres.
Outro exemplo são os motociclistas,
que exigem respeito dos demais motoristas, mas trafegam em alta
velocidade no corredor e ficam extremamente irritados quando alguém
não os vê. Muitos deles não pagam o Seguro DPVAT, apesar dos
acidentes que os envolvem consumirem mais de 70% das indenizações.
Queremos direitos, mas não aceitamos deveres. Esse é o lema.
Quando somos multados, normalmente
vociferamos contra a chamada “indústria da multa”, criticamos o
abuso das autoridades e sempre procuramos um jeito de justificar
nossa infração. Os políticos também fazem isso: quando flagrados
pela Justiça, negam tudo e ainda acusam quem os pune. Por isso,
temos tantos parlamentares infratores dispostos a aprovar leis para
não punir os que cometem crimes no trânsito, assim como pessoas
dispostas a corromper um guarda para não ser multado.
Uma sociedade que atravessa na faixa,
não ultrapassa em local proibido, não trafega pelo acostamento e
não suborna agentes de trânsito, com certeza, vive num país com
menos corrupção e desigualdades. Nosso comportamento no trânsito
revela o tipo de país que queremos. Então, qual o Brasil que
queremos?