Um dos principais efeitos colaterais de tratamentos de câncer em
mulheres jovens - a falência prematura dos ovários e a
infertilidade -, que era bem conhecido, mas pouco compreendido,
acaba de ganhar uma explicação e de quebra, uma possibilidade de
ser evitado.
Um estudo feito por pesquisadores israelenses e publicado na
edição desta quinta-feira, 16, da revista científica Science
Translational Medicine avaliou o mecanismo de ação de um
quimioterápico conhecido como ciclofosfamida - droga de uma geração
mais antiga e que compõe coquetéis de tratamento principalmente
para casos de câncer de mama.
Investigando seu efeito em camundongos fêmeas, os pesquisadores
observaram que o medicamento, ao mesmo tempo em que impede a
proliferação de células cancerígenas, acaba promovendo o
crescimento de folículos presentes no ovário. Esses folículos são
aglomerados de células que contêm, cada um, um óvulo. Ao longo da
vida de uma mulher, a cada mês um pequeno número desses folículos
começa a crescer até atingir a maturidade, quando ocorre a
ovulação. Com o envelhecimento, esse número de folículos vai
diminuindo.
Os pesquisadores descobriram que a ciclofosfamida acelera esse
processo, fazendo com que todos os folículos comecem a crescer. E,
uma vez que se inicia o amadurecimento, o caminho é sem volta. O
reservatório, por fim, acaba sendo esvaziado. Daí a
infertilidade.
A boa notícia é que os cientistas, liderados por Lital
Kalich-Philosoph, descobriram que outra droga, apelidada de AS101,
foi capaz de proteger os ovários durante o tratamento. Os
camundongos que receberam a medicação juntamente com a
quimioterapia mantiveram mais folículos em seus ovários após o
tratamento do que aqueles que só tomaram o remédio anticâncer. E,
quando elas acasalaram algum tempo depois, conseguiram ter tantos
filhotes quanto animais que não tinham passado pelo tratamento.
A droga está em fase 2 de teste clínico - ou seja, está sendo
investigado se ela pode ser considerada segura para humanos. Mas
até se traduzir em um possível tratamento para mulheres ainda tem
uma longa distância.
Primeiramente, explica a oncologista Solange Moraes Sanches, do
A.C. Camargo Cancer Center, é preciso saber se outras drogas
quimioterápicas agem nos ovários do mesmo modo que a
ciclofosfamida. “Em geral, se sabe que praticamente todas têm esse
efeito de infertilidade, em maior ou menor grau, e de modo
temporário ou permanente.” Depois, é preciso ver se a AS101 teria o
mesmo desempenho diante dessas outras medicações.
Qualidade
Hoje essa é uma questão importante nos tratamentos de mulheres
jovens. E, como não há droga que evite a infertilidade, a saída é
congelar óvulos ou até embriões. “Antes, o importante era aumentar
a sobrevida, agora é garantir que essa vida seja de
qualidade.”