Fonte: Agora São Paulo
Desde o registro dos primeiros
casos de coronavírus aqui no Brasil, a prestação de serviços de
saúde mudou. Por um lado, aumentaram as internações de alta
complexidade e a necessidade de leitos para atender aos pacientes
que têm complicações provenientes da doença. Por outro, os
procedimentos eletivos estão sendo reduzidos, pois quem não precisa
de tratamento emergencial está adiando a ida ao médico.
“O aumento de demanda por serviços
médicos em decorrência da pandemia fez crescer também as despesas
relacionadas, o que exige um reforço de caixa às operadoras. Já os
atendimentos não urgentes postergados serão represados e realizados
em algum momento, correndo o risco de ocorrerr uma avalanche de
procedimentos”, disse a Abramge (Associação Brasileira de Planos de
Saúde).
O que isso significa? Como o fluxo
de caixa das operadoras é um importante elemento para o cálculo das
mensalidades dos planos de saúde, essa mudança no padrão de
despesas também deve influenciar todo o mercado de saúde
suplementar.
“As operadoras de planos de saúde
repassam cerca de 85% de suas receitas assistenciais para os
prestadores, como hospitais, médicos, laboratórios e outros”, conta
Vera Valente, diretora executiva da FenaSaúde (Federação Nacional
de Saúde Suplementar).
Ela explica que o pagamento
proveniente dos planos representa 90% da receita dos hospitais e
80% do faturamento dos laboratórios e empresas de medicina
diagnóstica.
Os planos vão ficar mais caros?
Antes de tudo, vale dizer que os reajustes fiscalizados pela ANS
(Agência Nacional de Saúde Suplementar) são os relativos a planos
individuais, planos por adesão (de sindicatos ou categorias) e
planos empresariais com até 29 assegurados.
Os planos coletivos e empresariais
com mais de 30 assegurados não precisam submeter os aumentos ao
órgão regulatório — há apenas uma comunicação formal.
Em 2020, a ANS limitou o reajuste
médio a 7%. O Senado aprovou um projeto que prevê o adiamento da
correção das mensalidades de todos os planos por 120 dias. A
proposta ainda precisa ser votada na Câmara e, caso aprovada, teria
que ser sancionada pelo presidente Jair Bolsonaro.
No entanto, as próprias entidades
que representam as operadoras de saúde se anteciparam e estão
recomendando um adiamento de até 90 dias do reajuste previsto para
este ano.
Por que houve essa recomendação? A
recomendação não é obrigatória — ou seja, as operadoras podem ou
não aderir ao adiamento do reajuste. No entanto, os grandes grupos
já anunciaram que decidiram promover o alívio temporário nos
contratos.
“O foco é manter a cadeia de saúde
em seu pleno funcionamento. Isso significa garantir a remuneração
dos prestadores e, assim, assegurar o melhor atendimento a milhões
de beneficiários”, diz Valente, da FenaSaúde. Ela diz que as
operadoras associadas à entidade optaram por postergar os aumentos
nos planos individuais, por adesão e de pequenas empresas com
reajuste previsto entre 1º de maio e 31 de julho.
E o que acontece depois? Não se
trata de um perdão, e sim de um adiamento. Portanto, a diferença
das mensalidades não reajustadas será cobrada depois desses 90
dias, criando um “tarifaço” nos convênios.
E como as operadoras veem esse
movimento? O receio das empresas que administram os planos é de que
haja um aumento na inadimplência dos planos.
“A dificuldade de empresas e
pessoas físicas contratantes de planos de saúde em manterem o
pagamento das contraprestações em dia põe em risco o repasse
financeiro aos hospitais, clínicas e prestadores de serviços que,
por sua vez, terão dificuldades em investir e honrar seus
compromissos com fornecedores, profissionais de saúde e outros”,
prevê a Abramge.
E os planos empresariais? Os dados
oficiais sugerem que o fechamento de vagas formais também se
intensificou durante a pandemia. Entre março e abril, mais de 1,1
milhão de trabalhadores com carteira assinada foram dispensados. O
setor formal é um dos principais pilares do setor de convênios
médicos.
“A situação econômica do país tende
a piorar, segundo as projeções atuais, então é possível esperar que
mais gente deixe de ter um plano de saúde porque perdeu ou perderá
o emprego. Por outro lado, há evidências também de que pessoas que
não tinham convênio estão mais inclinadas a contratar um agora”,
analisa Ligia Bahia, médica sanitarista e professora da UFRJ.
Lucas Andrietta, pesquisador da
Faculdade de Medicina da USP, lembra que parte das operadoras já
vinha reduzindo ou extinguindo a oferta de planos individuais, e
que a pandemia só intensificou essas restrições. Isso tudo indica
uma redução no acesso à saúde suplementar, algo mais que
indesejável em um momento de pandemia.